A personificação e a humanização das inteligências artificiais têm conquistado um papel importante no universo digital
Quem nunca conversou com uma tal de Siri? E a Alexa, quem já bateu um papo com ela? Grandes empresas de tecnologia foram as primeiras a possuírem inteligências artificiais ao seu favor, a diferença é que as pessoas não conhecem a figura desses assistentes. Seja a Siri da Apple, Alexa da Amazon ou até mesmo o Google Assistant, nos últimos tempos, a personificação e a humanização dos assistentes virtuais ganharam vida na comunicação das marcas. Com o objetivo de realizar um atendimento mais próximo do consumidor, trazer mais informação e tirar dúvidas, esses personagens conquistaram um papel importante no universo digital.
No Brasil, a mais conhecida é a Lu, da Magazine Luiza ou Magalu. Ela nasceu em 2003 para humanizar a experiência de compra do e-commerce da loja. Com seu carisma, conquistou fãs e se tornou influenciadora. Atualmente, a personagem conta com mais de 5 milhões de seguidores no Instagram.
De lá pra cá, novos assistentes virtuais surgiram, como a Nat, da Natura, a Ully, da Ultragaz, o CB, da Casas Bahia, a Bia, do Bradesco e, mais recentemente, a Mara, da Amaro.
Partindo da premissa que deveria ajudar o time da Marca, a Mara é única. Ela foi criada por meio de uma técnica mista que envolveu diversos profissionais: para compor a sua personalidade, o visual e o mapa astral ajudam nessa construção; por ser antenada na moda, a influencer esbanja uma variedade de roupas para cada ocasião.
Apostar na criação de uma assistente virtual pode ser uma ótima forma de gerar identificação com a persona da Marca, isso porque quando as pessoas se identificam com os conteúdos, elas tendem a se aproximar e se sentem mais compreendidas, mesmo se a interação for com um robô. Além disso, o investimento em assistentes virtuais demonstra mais interesse em adaptação ao digital, e, consequentemente, clientes que estão presentes nesse meio passam a demonstrar mais afeição pela empresa. Um exemplo: ao ver a Lu, associamos imediatamente a uma ação envolvendo a Magazine Luiza.
Para Igor Cardoso, sócio-diretor de planejamento da Ana Couto, as assistentes virtuais têm um papel importante: “Muito mais do que serviços de atendimento, os assistentes virtuais viraram entretenimento, educação e se tornaram publishers essenciais para dar vida à personalidade da marca. Marcas como Magalu e Casas Bahia estão levando seus assistentes virtuais para passion points de seus públicos, como música e games, e tendo resultados bem interessantes”, explica.
Com diversas abordagens e diferentes perfis, mas, na sua maioria, figuras femininas, o uso desses personagens deve crescer mais nos próximos anos. Além da interatividade entre assistentes e consumidores, eles já provaram que não estão no universo digital somente para popularizar suas respectivas marcas. Afinal, quem não se posiciona pode colocar em perigo o seu próprio storytelling.
ATIVISMO E INFLUENCIADORAS VIRTUAIS
Diante do novo cenário digital, o Bradesco se uniu a Magazine Luiza, Vivo, Natura e Ultragaz em prol da campanha global “Hey, atualize minha voz”, realizada pela Unesco para combater mensagens sexistas, machistas e agressivas dirigidas às assistentes virtuais. Em uma conferência da Unesco sobre inteligência artificial, um dos assuntos debatidos foi a papel das personagens na sociedade.
Somente no ano passado, o Bradesco registrou 95 mil tentativas de assédio. Em resposta a esse comportamento, o banco anunciou a mudança de tom da Bia em respostas para propostas indecentes ou xingamentos. Por exemplo: “Essas palavras não podem ser usadas comigo e com mais ninguém” ou “Para você, pode ser uma brincadeira. Para mim, foi violento.” Nos últimos dois anos, de acordo com a plataforma Stilingue, especializada em monitorar redes sociais, houve um aumento de 40% a menções de assédio nas redes.
Antes desse movimento, em 2008, a Lu já havia passado por momentos delicados. Frases como “Namora comigo”, “Quero vê-la de biquini” e “Qual o seu WhatsApp?” eram direcionadas à influencer. Na mesma época, ela se manifestou no Twitter e pediu por mais respeito. No Dia Internacional da Mulher de 2020, a Lu criou uma ação dentro do seu aplicativo, “Ei, moça, finja que vai fazer uma compra no aplicativo Magalu. Lá tem um botão para denunciar a violência contra a mulher”. Segundo a varejista, a ferramenta não só ganhou notoriedade, mas registrou um aumento de 400% nos cliques no mês seguinte.
Em uma ação de incentivo à autoestima, a Mara iniciou sua transição capilar em parceria com a L’Oréal, que passou a ter seus produtos no e-commerce da Amaro. Com apoio dos seus seguidores, por meio de uma enquete no perfil da Marca no Instagram, ela oferecia alternativas para mudar o visual da personagem. A ação teve a duração de 24 horas e cerca de 75% dos participantes optaram pela transição capilar da assistente. Durante esse movimento, a personagem relatou nas redes como tem sido esse movimento de abandonar as químicas e aceitar as suas novas madeixas.
A Nat, da Natura, também passou por um processo de transição capilar em 2016. Diferente da Mara, ela é a primeira assistente virtual negra. No início, alguns comentários racistas foram registrados pela marca, porém, por mais que algumas pessoas estivessem descontentes com a influenciadora, outras se sentiram orgulhosas pela representatividade, principalmente quando o tema é assumir os cachos.
Virtuais ou não, o ponto é colocar em discussão temas importantes da sociedade. Marcas são responsáveis por gerar conexões emocionais e também atuarem de forma ativa em questões que não são “mimimi”, a prova disso é a presença cada vez mais assídua das assistentes nessas pautas.
Por Mateus Alcântara e Marcelle Villar