É o fim de qualquer escritório?
O modelo de open space office surgiu para estimular a interação e colaboração entre as equipes, porém vem sendo questionado por muitas pessoas ao longo dos anos. Em tempos onde precisamos limitar a proximidade e interações sociais, como esse modelo se reinventará?
Diversos artigos e estudos (falarei de alguns abaixo) mostram como esse modelo, de espaços abertos com grande concentração de pessoas juntas, não traz todos os resultados esperados. É importante entendermos por que adotamos esse modelo, quais os benefícios e malefícios que ele traz e como podemos evoluir a partir de agora.
Como chegamos até aqui?
Escritórios abertos não são nenhuma novidade, eles existem desde o início do século 20, mas foi quando o Google renovou sua sede em 2005 que esse modelo virou sinônimo de sucesso. Espaços abertos, flexíveis e baseados em atividades substituíram cubículos e paredes. As empresas acreditavam que ao remover essas barreiras, aumentariam a visibilidade entre as pessoas, a colaboração e interação entre as equipes e, consequentemente, a agilidade e produtividade. Quem nunca ouviu: “Quero meu escritório igual ao do Google.”
Existe também um outro motivo, menos excitante, que é a economia dos custos fixos. Escritórios abertos custam menos, pois conseguimos ter mais pessoas em menos metros quadrados. Um estudo da CoreNet Global mostrou que nos EUA, a metragem por funcionário caiu de 76 m² em 2010 para 54 m² em 2013. Além disso, um ambiente aberto também facilita o planejamento para crescimento futuro, pois, se tudo der certo nos negócios, é só colocar mais mesas no ambiente.
O lado bom de trabalhar em um escritório aberto
Poder interagir diariamente com pessoas fora de sua equipe aumenta seu repertório, podendo até ajudá-lo em um “insight” na hora do trabalho. Além disso, um único salão, com todos juntos no mesmo tipo de bancada pode ser menos intimidante para algumas pessoas. Elas não se sentirão constrangidas em bater na porta de alguém. Esse modelo, de fato, promove maior interação entre as pessoas, desde que elas estejam na mesma bancada ou no mesmo andar. Quanto mais afastadas fisicamente, menos elas interagem.
As palavras-chave aqui são interação e colaboração.

Nos últimos 20 anos, o tempo que dedicamos a “atividades colaborativas” nos escritórios aumentou 50% ou mais. Ambientes que propiciam o contato mais frequente e de maior qualidade com outras pessoas melhoram comunicação e colaboração.
Outro benefício não planejado inicialmente tem a ver com a saúde dos funcionários. Uma publicação no periódico médico britânico Occupational and Environmental Medicine revela que funcionários de escritórios abertos tendem a se movimentar mais no trabalho, sendo 32% mais ativos fisicamente que as pessoas que trabalham em escritórios particulares e 20% mais ativos que pessoas que trabalham em cubículos. Mais importante, os trabalhadores que eram mais ativos tinham “14% menos estresse fisiológico fora do escritório em comparação com aqueles com menos atividade física no escritório”.
O lado não tão bom de trabalhar em um escritório aberto
Em escritórios abertos, somos bem mais interrompidos. Percebemos isso pela quantidade de pessoas usando fones de ouvido.
Deveríamos tratar os escritórios abertos como bibliotecas e não como cozinhas caóticas.
Pesquisas mostram que 65% das pessoas criativas precisam de silêncio para fazer o melhor trabalho. Quando os funcionários não conseguem se concentrar, eles tendem a se comunicar menos. Em um ambiente aberto, temos menos conversas profundas e mais conversas superficiais, pois sabemos que todos podem nos ouvir.
Um estudo da HBR mostra que as interações face a face caíram cerca de 70% após a transição das empresas para os escritórios abertos, enquanto que as interações eletrônicas aumentaram para compensar, ou seja, em vez de estimular a colaboração, o ambiente totalmente aberto parecia fazer as pessoas se esquivarem socialmente. Os funcionários criam uma quarta parede em relação a seus pares e colegas e passam quase a ignorar suas existências (quando não são interrompidos).
Uma outra preocupação bem atual na verdade, é como esse modelo de escritório pode aumentar a propagação de germes, aumentando a frequência com que os funcionários ficam doentes. Um estudo de 2014 analisou as taxas de licença médica em 1.852 empresas suecas, e constatou que havia um “risco significativo” para as pessoas que trabalham em escritórios abertos.
Uma verdade sobre escritórios abertos é que eles se tornaram bem menos abertos com o tempo, simplesmente porque começamos a colocar mais gente no mesmo espaço. Esse é um baita problema agora que precisamos de, pelo menos, 1,5m de distância das pessoas…
Ok, o que fazemos agora?
Sabíamos que precisávamos reinventar nossos escritórios mesmo antes da pandemia. Nesse momento, percebemos que conseguimos (de certa forma) trabalhar de casa e manter a qualidade da nossa entrega (imagine quando não tivermos todo esse temor como pano de fundo). Muitas empresas já estão adotando o homeoffice para sempre (mesmo que isso ainda gere algumas discussões).
Todo o conceito de escritório aberto surgiu para incentivar a colaboração e interação e reduzir custos fixos das organizações.
Hoje, temos diversas plataformas que auxiliam no trabalho colaborativo, sejam plataformas de videoconferência, conversa, troca de arquivos, criação conjunta… enfim, uma infinidade de tecnologias. Essa parte parece estar um pouco mais resolvida.
Para a redução dos custos fixos, nada melhor do que não ter esse custo(?!). Ok, é pouco provável qua as empresas abandonem de vez um endereço físico, mas elas não precisarão contar com todos indo ao escritório ao mesmo tempo e isso permitirá que revejam toda a necessidade espacial. Imaginem o que vai acontecer com o mercado imobiliário.
Bom, sendo prático, como podemos repensar esses espaços e até a nossa relação com o trabalho?
1) Precisamos melhorar a experiência do homeoffice. Essa realidade veio para ficar e precisamos cuidar da nossa saúde mental para isso. Esse artigo da FastCompany traz boas dicas para todos nós.
2) Entender os gargalos para as pessoas chegarem até o escritório. Já conhecemos três deles: os transportes públicos, pois somente uma minoria vai de carro para o trabalho; as recepções dos prédios, que concentram um monte de gente; e os temidos elevadores, onde é impossível respeitar o espaço entre as pessoas. Uma vez identificados esses gargalos, e tendo um plano para resolvê-los (eu ainda não tenho), é possível adotar as próximas medidas.
3) Ressignificar a recepção do seu escritório. Aquele espaço super cool, com um grande balcão de recepção, deverá funcionar mais como uma barreira sanitária, onde as pessoas irão se higienizar e talvez até trocar de roupa. Isso não quer dizer que esse local deva ser frio e totalmente asséptico, ok?
4) Adotar um circuito no escritório, como um autorama mesmo, em que as pessoas circulam sempre na mesma direção, impedindo que elas se cruzem. Será o fim da conversa de corredor (pelo menos por enquanto).
5) Garantir o correto distanciamento entre as pessoas. Para isso, as áreas comuns como lounges e cafés ficarão bem restritos. É preciso aumentar o espaçamento entre as mesas ou até (veja só…) criar cubículos. Se o seu escritório usa grandes bancadas, é só pular uma mesa e dispor as pessoas em zigue-zague.
6) Priorizar o uso de espaços individuais, como phonebooths e salas menores (só com uma pessoa, por favor).
7) Fazer grandes marcações de onde as pessoas podem ficar. Parece bobo, mas esses estímulos visuais ajudam bastante.
8) Criar divisórias flexíveis com quadros brancos para escrever. Além de auxiliar na separação física do ambiente, ajuda no trabalho e incentiva a discussão, mantendo a distância necessária.
9) Outros aspectos importantes são garantir a entrada da luz do dia e de incorporar elementos naturais no escritório, como plantas (essa dica também vale para o trabalho em casa). Como estamos ficando mais tempo olhando para uma tela, é importante nos cercarmos com o máximo de natureza que conseguirmos.
10) Por fim, trabalhar fazendo o rodízio de funcionários. Precisamos entender como funcionam as dinâmicas das diferentes equipes e organizar como elas podem usufruir do espaço, um grupo de cada vez.
Se for possível adotar todas essas dicas, ainda é importante entender que a nossa necessidade de ir até o escritório mudou completamente. Portanto, esse ambiente precisa ser cada vez mais inspirador para que queiramos, de fato, habitá-lo.